O Pé Torto Congênito (PTC) é uma deformidade que acomete principalmente os meninos, e acontece em uma proporção de 1 a cada 1000 nascidos vivos.
Além disso, sabemos que em até 50% dos casos, a doença acontece nos dois pés ao mesmo tempo, ou seja, é bilateral.
Exemplo de Pé Torto Congênito unilateral esquerdo.
Exemplo de Pé Torto Congênito bilateral
Antigamente, o tratamento se baseava na correção cirúrgica, sem nenhum tipo de tratamento com gesso antes da cirurgia. Infelizmente, os resultados obtidos geravam pés rígidos, dolorosos e com grandes cicatrizes.
Atualmente, realizamos o tratamento a partir de um método chamado de Ponseti, e conseguimos excelentes resultados com gessos que são trocados semanalmente e um pequeno corte no Tendão de Aquiles.
O Pé Torto Congênito é diagnosticado no exame físico, pelo médico Pediatra ou Ortopedista. Nenhum exame de imagem, como raio-x ou ultrassom, é necessário para o diagnóstico.
É interessante ressaltar que, durante a gestação, através dos ultrassons morfológicos, podemos ter uma pista se o bebê tem ou não o PTC. Todavia, só conseguimos confirmar o diagnóstico ao nascimento, e vamos explicar o por quê disso.
O Pé Torto Congênito é caracterizado por 4 deformidades e 1 característica. As 4 deformidades são:
As deformidades em Cavo (vermelho), Aduto (azul), Varo (verde) e equino (preto).
E a característica é:
Portanto, quando examinamos um bebê que possui estes achados nos pés, podemos dizer que ele possui o Pé Torto Congênito. Contudo, se o pé parece um PTC, porém não é rígido, trata-se de um Pé Torto Posicional, o qual não necessita de tratamento específico.
Hoje em dia, o principal tratamento é baseado em um método denominado “Ponseti”. O Dr. Ignacio Ponseti, médico espanhol, criou este método na década de 1950. Contudo, a técnica não foi difundida de maneira adequada por muitos anos.
Com o advento da Internet, nas últimas duas décadas este tipo de tratamento se tornou conhecido em todo mundo, e estudos foram feitos para comprovar que ele é o tratamento “padrão ouro” em relação às técnicas cirúrgicas antigas. Hoje, sem dúvida alguma, o método de Ponseti é a opção mais adequada de tratamento para o Pé Torto Congênito.
Dr. Ignacio Ponseti (Fonte: http://www.ponseti.info/dr.-ponseti.html)
A técnica se baseia na manipulação do pé seguida da aplicação de um gesso inguino-podálico (que vai da coxa até o pé). Lembramos que as trocas de gesso são realizadas semanalmente. Geralmente, são necessárias de 3 a 5 trocas de gesso para que o pé seja trazido para uma posição adequada. Nos casos mais graves, ou associados a doenças como a Artrogripose e a Mielomeningocele, geralmente são necessárias mais trocas de gesso.
Exemplo de gesso bilateral para tratamento do pé torto congênito. Este caso corresponde à primeira aplicação.
Exemplo de gesso bilateral para tratamento do pé torto congênito. Este corresponde ao último gesso antes da tenotomia. Pereba como os pés que apontavam para dentro, agora apontam para fora.
Ao final da série de gessos, conseguimos corrigir as 3 primeiras deformidades: o Cavo, o Aduto e o Varo. Entretanto, na maioria dos casos, os gessos não são capazes de deixar o pezinho para cima – ou seja, de corrigir a deformidade de chamamos de “Equino”.
Portanto, após as trocas, é necessário realizar um procedimento chamado “Tenotomia do Tendão de Aquiles”. Este consiste em cortar o tendão atrás do pé, também chamado de Tendão Calcâneo. Esta pequena cirurgia, faz parte do método de Ponseti.
Imagem que demonstra a aplicação da anestesia local, antes da Tenotomia do Tendão de Aquiles.
Imagem que demonstra o momento da Tenotomia do Tendão de Aquiles, necessária para correção da deformidade em “equino”.
Ressaltamos que este procedimento é realizado com Anestesia Local, não sendo necessária a intubação do bebê e nem colher exames de sangue ou outros tipos de invasão. A Tenotomia pode ser realizada no Consultório ou no Centro Cirúrgico, mas sempre com Anestesia Local. Além disso, não é necessário fazer jejum prolongado e o bebê já pode mamar novamente logo após o procedimento.
Após a cirurgia, confeccionamos um gesso semelhante aos anteriores, mas agora o pezinho aponta para cima, e não mais para baixo. Este gesso deve ser usado sem trocas por 3 semanas.
Um detalhe importante: como não damos pontos na pele, é comum acontecer um sangramento na parte de trás do gesso, que pode aparecer nos primeiros 2 dias após a cirurgia. Isso é normal, e os pais não devem se preocupar caso o gesso fique sujinho atrás do calcanhar. Em caso de dúvidas sobre a magnitude do sangramento, avise o seu médico.
Exemplo de sangramento que pode aparecer até 2 dias depois da Tenotomia. Este sangramento é esperado após a Tenotomia, pois não damos pontos na ferida. Em caso de dúvidas, avise seu médico.
Ufa, terminamos o período em que o paciente fica engessado! E agora, o que fazer?
Costumo dizer às mães que a parte mais importante do tratamento é justamente essa, a fase em que o paciente não usa o gesso. Digo isso pois, durante a fase dos gessos, o médico tem o controle do tratamento. A única coisa que os pais precisam fazer é trazer o bebê para as trocas e cuidar do gesso. Contudo, a fase que se inicia agora depende muito dos pais, para que consigamos garantir a manutenção da correção adquirida com os gessos e a cirurgia.
Como dito anteriormente, após a cirurgia o bebê deve ficar de gesso por 3 semanas. Após retirarmos o gesso, iniciamos o uso da Órtese de Abdução.
Existem vários modelos no mercado, confeccionados de várias maneiras. Muitas vezes encontramos ela com o nome de “Órtese Ponseti”, “Órtese de Denis Browne” ou “Botinhas de Pé Torto”.
Ressaltamos que a Órtese de Abdução já deve estar disponível quando retiramos o gesso, para uso imediato. Seu médico indicará o modelo mais adequado para o tratamento do seu bebê.
Exemplo de Órtese de Abdução. O objetivo da Órtese é manter a correção obtida com o tratamento dos gessos.
A Órtese de Abdução deve ser utilizada 23 horas por dia durante os primeiros 3 meses após a retirada do gesso. Ou seja, a órtese deve ser usada o dia inteiro, exceto para banho e trocas de roupa eventuais.
Depois deste período a utilização deve ser feita por 14 horas por dia, preferencialmente nos períodos de sono, até os 4 anos de idade!
Muitos pais estranham que essa duração do tratamento seja tão longa, porém o uso durante os primeiros 4 anos de vida do bebê é o que garante a manutenção da correção conseguida com os gessos.
ATENÇÃO: A não utilização da Órtese de Abdução é comprovadamente a maior causa de recidivas, ou seja, de o pé voltar a entortar. Caso isso aconteça, todo tratamento deverá se reiniciado!!!
Nesta fase do tratamento é importante estar bem próximo do seu médico, realizando nos primeiro mês consultas semanais, para que a órtese seja utilizada da maneira adequada. Quando os pais já estão acostumados ao aparelho, o tempo máximo de espaçamento das visitas que recomendamos é de 3 meses.
Para dicas sobre a colocação adequada da órtese, acesse.
Fontes:
Ponseti Internacional
Global Help
Não! Quando o tratamento é realizado no início da vida não há atrasos no desenvolvimento. Ou seja, o bebê engatinha e anda no tempo certo! Isso acontece pois durante o tempo de gesso e órtese em tempo integral a criança ainda não tem nem a capacidade de rolar. Logo depois, com o uso parcial da Órtese, a criança fica livre durante o dia para se desenvolver, engatinhar, andar e correr, como um bebê que não tem PTC.
Não! Os pacientes tratados pelo método de Ponseti tendem a ter pés flexíveis, funcionais e sem dor! Inclusive, existem vários atletas profissionais que tiveram Pé Torto Congênito na infância e foram tratados pelo método de Ponseti.
Sim, isso é verdade. Por mais que tratemos o PTC rapidamente, o comprimento do pé será menor do que o do outro lado (em casos unilaterais). Porém, isso não gera déficits de função. A panturrilha do lado afetado também costuma ser mais fina, mas isso também não gera prejuízo de função.